Quantos de nós já se perceberam totalmente focados em resultados, de um futuro próximo ou distante, e nos desconectamos do que acontece ao nosso redor? Muitas vezes não nos sentimos presentes naquilo que fazemos e, tampouco, com as pessoas próximas a nós.

Quantos obstáculos existem em nossa mente que inibem a excelência do desempenho?

 

Quantas vezes já escutamos aquelas frases clichês como “seja o protagonista de sua vida”, “não dê poder para o ambiente”, “tenha hábitos de sucesso” e uma do Ghandi, que particularmente gosto bastante, “seja a mudança que quer ver no mundo”.

 

Apesar de respeitar todas essas afirmações, alguns acreditam que é só pensar positivo que tudo dará certo. Porém, você já se deu conta do quanto demoramos a nos livrar de um mau hábito e aprender um novo?

 

Agora, imagine todos esses desafios de concentração, desempenho, falta de presença, mente relaxada sendo enfrentados diariamente pelos líderes atuais, que buscam incansavelmente a alta performance: ao menos por aqueles que acreditam no seu propósito como líderes.

 

Esses desafios são os mesmos para todos os líderes, a questão é: como efetivamente entender o que acontece no nosso interior para de fato gerar uma mudança efetiva?

 

Nos últimos 10 anos como Coach, Trainer e Professor em Liderança tenho vivenciado grandes mudanças de comportamento e transformações maravilhosas em vários profissionais. Descobri várias maneiras de provocar a mudança nas pessoas, principalmente através do coaching e do nosso programa de imersão em liderança, o Líder do Futuro, no qual já desenvolvemos milhares de líderes e obtivemos vários cases de sucesso.

 

Porém, em janeiro, tive uma experiência ainda mais enriquecedora sobre a poder do coaching. Como acredito que estamos em constante aprendizado, participei da certificação internacional do Inner Game School of Coaching, com o pai do coaching, Tim Gallwey. Foram dois encontros no Brasil e um na Califórnia, em Westlake Village.

 

Foi um momento de profundo aprendizado e simplicidade, no qual tive contato com a essência do coaching. Estar na presença desse profissional de 75 anos de idade, entre outros profissionais que lá estavam, me trouxe insigths e mudanças simples no pensar e no agir como pessoa, líder e principalmente como coach.

 

Tim Gallwey iniciou o seu trabalho através do jogo de tênis, que resultou na publicação do livro: O Jogo Interior de Tênis. Na obra, ele fala da queixa mais comum dos esportistas que é: “não que eu não saiba o que devo fazer, é que eu não faço aquilo que sei”.

Isso me levou a refletir sobre os milhares líderes que já treinei, e ainda treino, que sabem tudo sobre liderança: o que é, como diferenciar bons de maus líderes, identificar as principais características de seus liderados, os maiores desafios no cenário atual etc.

 

Mas, quando recebem uma avaliação 360a inesperada e, algumas vezes, totalmente oposta a tudo aquilo que sabem, alguns dizem: “não que eu não saiba o que fazer, é que algumas vezes não consigo fazer aquilo que sei”. O que realmente nos atrapalha para sermos mais eficientes?

 

Existem momentos nos quais nos esforçamos acima do normal para alcançar um resultado medíocre, ou até satisfatório, mas, você se recorda de alguma situação que, com menos esforço, o resultado foi excelente? Quando você se sentiu na “vibe”, quando até algumas pessoas comentaram que você estava impossível, naquele momento em você estava conectado com tudo o que fazia.

 

De maneira simples, é disso que se trata o Inner Game. Temos uma voz interior que muitas vezes nos atrapalha, que quer controlar tudo, uma voz julgadora que aparece quando o “eu” está falando comigo mesmo. Mas quem é esse “eu” e o “comigo mesmo”?

O “eu” controla, julga e dá instruções, o “comigo mesmo” executa e, após a execução, o “eu” faz a avaliação do resultado. Tim Gallwey chama o primeiro de EGO1 (instrutor) e o segundo de EGO2 (realizador). Um exemplo que adorei é a criança que aprende a andar.

 

Ninguém a ensinou como dar cada passo e como deveria fazer; ela simplesmente aprendeu vendo e executando, sem o julgamento dela mesma. Vocês já perceberam o quanto uma criança fica concentrada quando está brincando, o  quanto ela se conecta com o que ela faz? Será que hoje, como adultos, conseguimos fazer isso?

 

Quantos pensamentos, julgamentos e críticas nos atrapalham de realizar tudo o que fazemos no dia a dia? Apliquei esse conceito na minha vida pessoal e tive duas experiências de sucesso que gostaria de compartilhar.

 

No final de semana seguinte ao da certificação, viajei à praia para descansar e praticar um esporte que adoro, o surf. No sábado entrei no mar com foco em “pegar” a melhor onda, totalmente focado no resultado. Já fazia alguns meses que não entrava no mar para surfar e saí de lá frustrado, pois o esforço foi grande, mas o resultado insatisfatório.

 

No domingo fui novamente para o mar e antes de entrar pensei: “surfar me relaxa, me conecta com a natureza, me sinto livre” e lembrei dos conceitos do Inner Game. Esqueci a meta de performance, parei para prestar atenção no que estava acontecendo e deixei fluir.

 

Criei apenas um foco de atenção, que foi o de observar como eu estava subindo na prancha, e deixei acontecer. Fiquei impressionado com o resultado. Peguei todas as ondas, foi aí que veio a performance, aprendizado e a diversão.

 

No sábado havia utilizado totalmente o meu EGO1 para controlar, dar instruções e esforço sem aprendizado e diversão. Já no domingo, sai do mar sorrindo e um pouco impressionado com a simplicidade do processo do Inner Game. Quando aumentamos a nossa consciência e nos conectamos com nós mesmos, o resultado é consequência.

 

Na outra experiência, fui para academia treinar uma modalidade que combina Ginástica Olímpica, Atletismo e levantamento de peso, chamada de Cross Fit. É um treinamento intenso, bastante desgastante, exige muito da resistência física e, em alguns casos, provoca a sensação do querer desistir.

 

Estava finalizando o treino e já estava sem forças e nenhuma resistência, quando parei e pensei no Inner Game. Comecei a prestar atenção apenas na minha respiração e nas batidas do coração, me esqueci do cansaço físico e das dores no corpo. Resultado? Finalizei todos os movimentos sem sofrimento e sem julgamento.

 

Antes de focar na respiração e nas batidas do coração, meus pensamentos eram: por que estou fazendo isso? Que exagero? Já estou cansado, já chega, posso parar, não volto mais. Esses pensamentos sumiram, dando espaço à execução com excelência e performance.

 

Na prática, a equação que garante esse resultado é bastante simples: (P = p – i), onde P = Performance, p = potencial e i = interferência.

 

Se criarmos maneiras de diminuir as interferências do EGO 1, conseguiremos atuar com nosso potencial máximo, é como tirar o “lixo” da nossa mente, diminuir as distrações que só nos atrapalham. No coaching individual, utilizei com vários dos meus clientes, em diversas situações, (o simples método que requer que eles se concentrem apenas em algo específico diminuiu a interferência.)

 

Lembro-me de outro exemplo: utilizei com uma equipe de vendas, em um coaching de equipe o mesmo método. Notei de início que o estresse resultante da meta de performance tirava o foco no atendimento ao cliente, e isso afetava o desempenho como um todo: criou-se um círculo vicioso.

 

Eu não foco no atendimento porque tenho que focar no resultado, não atinjo resultados porque não foco no atendimento. Apesar de vários feedbacks que a equipe recebia sobre os atendimentos prestados, no momento em que a cobrança pelos resultados chegavam, a equipe se esquecia do atendimento e o estresse tomava conta.

 

Para entender melhor o cenário, muitos integrantes da equipe entendiam que focar no atendimento ao cliente era agradá-lo e para isso ficavam com conversas intermináveis sem objetivos e sem entender a necessidade e o perfil do cliente e, quando a pressão aumentava, a objetividade era confundida com não atender o cliente.

Eu simplesmente os questionei com as seguintes perguntas:

  • Quanto tempo você dedica em cada atendimento com o cliente?
  • No final de cada atendimento, quais respostas foram obtidas?
  • Essas respostas são todas aproveitadas e pertinentes para satisfazer as necessidades dos clientes?
  • Quantas perguntas são feitas?

 

Eles não souberam me responder. Pedi para que cronometrassem por uma semana quase todas as ligações e quantificassem as perguntas e as qualificassem. O resultado foi surpreendente, pois o foco ficou em cronometrar e prestar atenção às perguntas, o que consequentemente diminuiu o tempo das ligações, aumentou a qualidade de briefing e propostas, e resultou em mais fechamentos.

 

Com isso, quase toda a equipe passou a diminuir as interferências que todos tinham e atuaram bastante na realização do EGO2, sem os julgamentos, críticas e avaliações. Aprendi, e estou aprendendo, a praticar o jogo interior: explorar o potencial ilimitado que existe dentro de cada um de nós.

 

O Inner Game é um conceito a ser utilizado na vida de qualquer profissional seja no esporte, no coaching e principalmente na liderança. Focar mais no EGO2, me conectar com o que estou fazendo, sem julgamento, deixando acontecer e realizar com presença.

 

Como diz D.T.Suzuki, na sua obra Zen e a Arte de Atirar o Arco: “o homem é um ser pensante, mas se suas grandes obras são realizadas quando ele não está calculando nem pensando. O ‘ser criança’ deve ser restaurado por meio de longos anos de treino, no esquecimento de si mesmo”.

 

Por Paulo Alvarenga (P.A.), VP e sócio-fundador da Crescimentum

 

Para saber mais:

Livro: O jogo Interior do Tênis, W. Timothy Gallwey
Site: www.theinnergame.com.br